sábado, 27 de dezembro de 2008

A Teoria do Hipopótamo

sábado, 27 de dezembro de 2008
Nunca tive o hábito de me envolver em discussões homéricas, quando muito, me permitia observar a situação, ponderando mentalmente os embates que vislumbrava. Contudo, naquela tarde de quinta-feira, o tema em questão era o filme “O Código Da Vinci”, baseado no best seller de Dan Brown, e a repercussão das alegações contidas na película, sobre um suposto envolvimento “afetivo” entre Jesus e Maria Madalena. O temor de que o filme pudesse, de alguma forma, abalar os pilares da fé cristã, principalmente entre os jovens, era o cerne da contenda filosófica.
Saindo de minha clausura avaliativa, ousei opinar que, há muito, outro tema igualmente perturbador me roubava o sono. Se tem um animal para o qual nunca encontrei uma utilidade prática era o hipopótamo. Pelo menos, até aquela data. O hipopótamo me parecia ser o fruto de uma cochilada divina, lá pela tarde do sétimo dia ou, um projeto que os engenheiros do céu esqueceram de arquivar na pasta “Projetos para Reanálise” e que o Todo-Poderoso, por acidente, levou a cabo.
Fitaram-me como se aguardassem o término de alguma piada herege, meio que perplexos, meio que curiosos, pelo meu comentário, no mínimo, insano. Então, sentindo-me o centro das atenções, em meu momento de glória, estufei o peito e falei pausadamente: “Afinal, prá que serve o Hipopótamo ?”
Os gregos tinham mania de batizar tudo que existia sobre a face da terra. Segundo a definição acadêmica, Hipopótamo (Hippopotamus anphibius) vem do grego "hippos + potamos" = cavalo da água (ou os gregos jamais viram um cavalo de verdade ou sofriam de graves distúrbios da visão. Cavalo?!?). Hipopótamo é o nome genérico de um mamífero ungulado, de pele muito grossa e nua, patas e cauda curtas, cabeça grande e focinho largo e arredondado, pertencente à família Hippopotamidae. Estes animais vivem geralmente próximos de rios, em bandos que chegam a ter de 30 a 50 indivíduos, onde passam grande parte do seu tempo. Os hipopótamos são herbívoros e alimentam-se durante a noite da vegetação existente nas margens dos rios que habitam.
Curiosamente é o animal que mais mata seres humanos na África. Mais do que leões, crocodilos ou leopardos... Como são extremamente territorialistas, se um distraído resolve passear de barco por seus domínios, corre o sério risco de virar estatística.
Não faz parte da cadeia alimentar de nenhum outro animal. Tampouco dos humanos. Não existe criação comercial de hipopótamos. Já vira alguém comendo um bife de hipopótamo? Bebendo um copo de leite de hipopótamo? Consta que o crocodilo é predador natural do hipopótamo. Considerando que um bebê hipopótamo já nasce, com algumas dezenas de quilos, quanto destes um crocodilo comeria por dia? Um adulto, nem cogito. Chegam a pesar entre 3.200 e 4.000 kg e medem algo acima dos 3 metros. Imaginar um crocodilo encarando um monstrinho destes...
O Hipopótamo não solta “pums”. Arrota-os. Expelem pela boca os gases produzidos pela digestão. Consomem entre 40 e 50 kg de gramíneas por dia e imaginem que “contribuição” para o aquecimento global, um grupo de hipopótamos oferece. Os dentes, em número de quatro, servem para se defenderem (de quem?) e como armas nos embates pela fêmea à época do acasalamento. E olha que a fêmea não é lá essas coisas...
Ao defecar, utiliza-se de sua pequena cauda para espalhar seus dejetos. Tudo bem, alguém poderia defendê-los dizendo que ao fazer esta “ginástica”, eles estariam adubando as margens dos rios para que seja mantido o estoque de gramíneas e com isso a preservação de diversas espécies herbívoras. Considerando que um bando de hipopótamos come um absurdo de gramíneas, chega a ser uma piada pensar que outras espécies teriam vez.
Logo, afirmei que o hipopótamo, era, num primeiro momento, um total desperdício da criação divina. E desafiei a encontrarem uma utilidade para o bicho.
Não se domestica um hipopótamo. Já vira alguém montado num hipopótamo? Um hipopótamo puxando uma carroça? Saltando ou dançando em um circo?
Indiferente às manifestações a favor do pobre animal, a pequena sala de refeições da empresa em que trabalho, virou um pequeno auditório e firme, continuei...
Considerando que Deus, ser onipotente, criador do céu e da terra e tudo que nela habita, o fez de forma que todas as suas criações estivessem intrinsecamente relacionadas, o hipopótamo, um ser inútil, sem função prática, teria que ter uma função mais nobre do que aparentava sob pena de ver cair por terra a verdade sobre a perfeição divina...
As reações foram as mais diversas. Teve aquele que riu e ficou com cara de quem perde o ônibus na chuva. Aquela que se indignou pela blasfêmia (e juro que não foi a minha intenção) e por pouco, não me recomenda pessoalmente aos quintos...
E antes que as coisas piorassem para mim, mencionei que, surpreendentemente, em minhas pesquisas descobri que o hipopótamo é citado na bíblia como uma obra prima de Deus, o que reforçava minha teoria. Refreei o desejo, quase mórbido, de meus pares, de me ensinarem a voar, considerando que me encontrava no terceiro piso.
Em Jó 40: 15-19, Deus diz: “Contempla agora o hipopótamo ( do original beemote ou beemonte), que eu criei como a ti, que come a erva como o boi. Eis que a sua força está nos seus lombos (alguns tradutores dizem Rins), e o seu poder nos músculos do seu ventre (ou estômago?!). Ele enrija a sua cauda como o cedro; os nervos das suas coxas são entretecidos. Os seus ossos são como tubos de bronze, as suas costelas como barras de ferro. Ele é obra prima dos caminhos de Deus; aquele que o fez o proveu da sua espada.”
Um teólogo, em um site da internet, responde que Beemonte ou Beemote, é uma palavra hebraica que traduzido é hipopótamo, e que segundo a Bíblia, Deus classifica-o como uma das maravilhas de Sua criação.
Por fim, ainda excitado com minhas conjecturas, voltei aos colegas, e desafiei-os. Como o hipopótamo poderia ser a Obra Prima da criação de Deus, sendo ele um bicho tão patético? Concluí, numa teoria inédita, que a importância só poderia estar dentro dele. Algo tão especial que justificaria sua existência e salvaria Deus de um mico celestial. Talvez uma bactéria, um vírus, algo endêmico, só dele, que pudesse, quem sabe, curar doenças como a AIDS, o câncer, a esclerose múltipla...
Pronto! Havia lançado minha Teoria.
Botei a pulga atrás de suas orelhas...
Aproveitando o burburinho dos presentes, encerrei meu breve discurso com um brado entusiasmado: “Cientistas, volvei vossos olhos ao Hipopótamo. Ele salvará a humanidade!”

O cronômetro do relógio me avisara que era hora de voltar ao trabalho.
Mentalmente dediquei aquele meu momento mágico ao hipopótamo cor-de-rosa que ornamenta a duchinha do chuveiro lá de casa...


O texto acima ficou em 2º Lugar no Crônicas FENAE 2007 (entre 118 textos)

1 comentários:

Unknown

Caro amigo Alexandre;
A razão de ser das coisas, incluindo a existência dos hipopótamos, é o resultado de uma equação perfeita formada pelas forças que regem o universo. A fonte de vida, em suas mais diversas formas, é o que chamamos de Deus. Achei o seu texto ótimo justamente por induzir o leitor a refletir sobre isso e a chegar à seguinte conclusão: devemos amar até a mais insignificante das criaturas vivas como a nós mesmos. Parabéns pelo insight! Caubi

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